quarta-feira, 11 de fevereiro de 2015

IGREJA, TÚMULO DE DEUS? (resenha)



Esse estranho título – Igreja, túmulo de Deus? –, que pode parecer uma ofensa aos mais sensíveis, está longe de sê-lo. É apenas uma brincadeira com uma passagem de Nietzsche, em A gaia ciência, onde um louco faz a famosa afirmação de que Deus está morto.

O livro é de 1967, e foi escrito pelo padre holandês Robert Adolfs. A data da publicação talvez faça pensar que são reflexões anacrônicas. Não são. Mas é obvio que o livro precisa ser lido com os olhos e o coração na atualidade. Precisa também ser lido tendo como horizonte reflexivo todas as igrejas cristãs, e não somente a Igreja Católica, como fez o autor.

O livro faz uma reflexão sobre a relevância do Cristianismo em seu contexto. Teologicamente falando, foi escrito no calor do desenvolvimento das teologias da secularização, cujo resumo tem a ver com reflexões sobre o lugar da religião (especialmente o Cristianismo) nas sociedades modernas, em processo avançado de secularização. Para o autor, as referidas propostas teológicas a este problema são insuficientes e insatisfatórias. Alguns interlocutores criticados são R. Bultmann, P. Tillich, Harvey Cox e P. Van Buren.

No meu modo de entender, a relevância e a atualidade do livro se encontram no diagnóstico apresentado por seu autor. Para ele, o problema do Cristianismo moderno tem a ver com seu projeto de poder. É daí que procedem seu desgaste e sua irrelevância no mundo atual. A alternativa apresentada Adolfs, que permanece vigente hoje, é apenas esboçada no livro. Ele a chama de “Igreja kenótica”, explorando o hino cristológico de Filipenses 2,5-11.

Kenósis é um verbo grego que quer dizer “esvaziar-se”. Portanto, segundo o autor, é se esvaziando de todas as formas de poder, presentes desde a relação entre clérigos e leigos, até a relação das igrejas com a sociedade, que o Cristianismo pode manter a relevância de sua mensagem e de sua vocação no mundo. Para o momento em que vivemos, creio que essa é uma reflexão muito atual e muito bem-vinda. O projeto de poder dos diferentes Cristianismos na atualidade, para mim, é um problema de primeira ordem, e que extrapola inclusive os muros da própria Teologia.

O livro é muito bem escrito. A tradução parece muito bem feita, o que facilita muita coisa. Indico bastante a quem ainda acha que essas coisas são importantes.


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