Encontros e desencontros. A vida da gente bem que
poderia ser resumida assim. Completamente sem querer eu encontrei Antonio
Marcos – que é um pseudônimo – guardando carros à noite, num estacionamento da
orla de Jatiúca. Antonio Marcos tem 34 anos de idade, é do interior de Alagoas,
mas vive sozinho, segundo ele, em um barraco na favela do Brejal, aqui em
Maceió. É solteiro, mas vive um romance de quase dez anos com uma mulher dez
anos mais velha. É que segundo Antonio Marcos, “menina nova não sabe de nada!”.
Voz mansa e bem articulada, Antonio Marcos me disse
que não gosta de drogas, mas curte uma cachacinha de tempos em tempos. Ninguém é
de ferro! É que é preciso trabalhar pra dar conta da vida. E Antonio Marcos
vende cerveja na praia. Mas para tanto, ele primeiro cata as latinhas usadas
deixadas no chão e as vende. Um quilograma, segundo me contou, custa em média
R$ 2,50, ou na melhor das hipóteses R$ 3,00. Com o dinheiro, compra cerveja em
lata e as vende em dia de sol. Depois cata as latas de novo... E assim a vida
vai caminhando, não em círculos, mas sempre pra frente.
Eu encontrei Antonio Marcos sentado em seu carro de
mão, feito de madeira e pneus de verdade, usados. Na verdade, não era dele
propriamente. Ele havia tomado emprestado de um amigo. Antonio marcos me dizia
que bom pra guardar carros mesmo é durante o dia. E me explicou. No carro havia
várias folhas de papelão, que eu julguei que também tivessem sido catadas para
a venda. Nada disso. As folhas de papelão cobrem os parabrisas dos carros, pra
diminuir o calor dos motoristas. Com o papelão, me dizia Antonio Marcos, o
trocadinho é garantido. Mas a noite, sem calor e sem papelão, me confessava ele,
poucos querem deixar o trocadinho.
Antonio Marcos precisava de R$ 100,00 pra terminar
seu barraco no Brejal. Foi por isso que ele decidiu esticar o expediente até a
noite. De fato, eu não sei ao certo a distância que separa o Brejal da Jatiúca.
Mas suponho, bem por baixo, que devam ser uns 10 km. É esse o seu percurso,
empurrando o carro de mão emprestado do amigo, catando as latinhas de cerveja do
caminho, para guardar carros à noite, à espera de trocados possíveis, mas não
certos. E sem “moral da história”. Porque o que a vida tem a ensinar está na
superfície dos fatos, na epiderme do cotidiano, e não oculto nas profundezas de
nossas quase sempre hipócritas “morais da história”.
Um comentário:
Bom ter seus textos de volta meu camarada...No meio do caminho, "Antonios, Zés e Marias"...A luta pela vida em cada esquina da nação.
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