segunda-feira, 13 de setembro de 2010

ELEIÇÕES 2010 - PRONUNCIAMENTO DA ALIANÇA DE BATISTAS DO BRASIL


PRONUNCIAMENTO DA ALIANÇA DE BATISTAS DO BRASIL
ELEIÇÕES 2010
A Aliança de Batistas do Brasil vem por meio deste documento reafirmar o compromisso histórico dos batistas, em todo o mundo, com a liberdade de consciência em matéria de religião, política e cidadania. A paixão pela liberdade faz com que, como batistas, sejamos um povo marcado pela pluralidade teológica, eclesiológica e ideológica, sem prejuízo de nossa identidade. Dessa forma, ninguém pode se sentir autorizado a falar como “a voz batista”, a menos que isso lhe seja facultado pelos meios burocráticos e democráticos de nossa engrenagem denominacional.
Em nome da liberdade e da pluralidade batistas, portanto, a Aliança de Batistas do Brasil torna pública sua repulsa a toda estratégia político-religiosa de “demonização do Partido dos Trabalhadores do Brasil” (doravante PT). Nesse sentido, a intenção do presente documento é deixar claro à sociedade brasileira duas coisas: (1) mostrar que tais discursos de demonização do PT não representam o que se poderia conceber como o pensamento dos batistas brasileiros, mas somente um posicionamento muito pontual e situado; (2) e tornar notório que, como batistas brasileiros, as idéias aqui defendidas são tão batistas quanto as que estão sendo relativizadas.
1. A Aliança de Batistas do Brasil é uma entidade ecumênica e dedicada, entre outras tarefas, ao diálogo constante com irmãos e irmãs de outras tradições cristãs e religiosas. Compreendemos que tal posicionamento não fere nossa identidade. Do contrário, reafirma-a enquanto membro do Corpo de Cristo, misteriosamente Uno e Diverso. Assim, consideramos vergonhoso que pastores e igrejas batistas histórica e tradicionalmente anticatólicos, além de serem caracterizados por práticas proselitistas frente a irmãos e irmãs de outras tradições religiosas de nosso país, professem no presente momento a participação em coalizões religiosas de composição profundamente suspeita do ponto de vista moral, cujos fins dizem respeito ao destino político do Brasil. Vigoraria aí o princípio apontado por Rubem Alves (1987, p. 27-28) de que “em tempos difíceis os inimigos fazem as pazes”? Com o exposto, desejamos fazer notória a separação entre os interesses ideológicos de tais coalizões e os valores radicados no Evangelho. Por não representarem a prática cotidiana de grande fração de pastores e igrejas batistas brasileiras, tais coalizões deixam claro sua intenção e seu fundo ideológico, porém, bem pouco evangélico. Logrado o êxito buscado, as igrejas e os pastores batistas comprometidos com as coalizões “antipetistas” dariam continuidade à prática ecumênica e ao diálogo fraterno com a Igreja Católica, assim como com as demais denominações evangélicas e tradições religiosas brasileiras? Ou logrado o êxito perseguido, tais igrejas e pastores retornariam à postura de gueto e proselitismo que lhes marcam histórica e tradicionalmente?
2. Como entidade preocupada e atuante em face da injustiça social que campeia em nosso país desde seu “descobrimento”, a Aliança de Batistas do Brasil sente-se na obrigação de contradizer o discurso que atribui ao PT a emergente “legalização da iniqüidade”. Consideramos muito estranho que discursos como esse tenham aparecido somente agora, 30 anos depois de posicionamentos silenciosos e marcados por uma profunda e vergonhosa omissão diante da opressão e da violência a liberdades civis, sobretudo durante a ditadura militar (1964-1985). Estranhamos ainda que tais discursos se irmanem com grupos e figuras do universo político-evangélico maculadas pelo dinheiro na cueca em Brasília, além da fatídica oração ao “Senhor” (Mamon?). Estranhamos ainda que tais discursos não denunciem a fome, o acúmulo de riqueza e de terras no Brasil (cf. Isaías 5,8), a pedofilia no meio católico e entre pastores protestantes, como iniquidades há tempos institucionalizadas entre nós. Estranhamos ainda que tais discursos somente agora notem a possibilidade da legalização da iniquidade nas instituições governamentais, e faça vistas grossas para a fatídica política neoliberal de FHC, além da compra do congresso para aprovar a reeleição. Estranhamos que tais discursos não considerem nossos códigos penal e tributário como iniqüidades institucionalizadas. Os exemplos de como a iniqüidade está radicalmente institucionalizada entre nós são tantos que seriam extenuantes. Certamente para quem se domesticou a ver nas injustiças sociais de nosso Brasil um fato “natural”, ou mesmo como a “vontade de Deus”, nada do mencionado antes parece ser iníquo. Infelizmente!
3. Como entidade identificada com o rigor da crítica e da autocrítica, desejamos expressar nosso descontentamento com a manipulação de imagens e de informações retalhadas, organizadas como apelo emocional e ideológico que mais falseia a realidade do que a apreende ou a esclarece. Textos, vídeos, e outros recursos de comunicação de massa, devem ser criteriosamente avaliados. Os discursos difamatórios tais como os que se dirigem agora contra o PT quase sempre se caracterizam por exemplos isolados recortados da realidade. Quase sempre, tais exemplos não são representativos da totalidade dos grupos e das ideologias envolvidas. Dito de forma simples: uma das armas prediletas da difamação é a manipulação, que se dá quase sempre pelo uso de falas e declarações retiradas do contexto maior de onde foram emitidas. Em lugar de estratégias como essas, que consideramos como atentados à ética e à inteligência das pessoas, gostaríamos de instigar aos pastores, igrejas, demais grupos eclesiásticos e civis, o debate franco e aberto, marcado pelo respeito e pela honestidade, mesmo que resultem em divergências de pensamento entre os participantes.
4. A Aliança de Batistas de Brasil é uma entidade identificada com a promoção e a defesa da vida para toda a sociedade humana e para o planeta. Mas consideramos também que é um perigo quando o discurso de defesa da vida toma carona em rancores de ordem política e ideológica. Consideramos, além disso, como uma conquista inegociável a laicidade de nosso estado. Por isso, desconfiamos de todo discurso e de todo projeto que visa (re)unir certas visões religiosas com as leis que regem nossa sociedade. A laicidade do estado, enquanto conquista histórica, deve permanecer como meio de evitar que certas influências religiosas usurpem o privilégio perante o estado, e promova assim a segregação de confissões religiosas diferentes. É mister recordar uma afirmação de um dos grandes referenciais teológicos entre os batistas brasileiros, atualmente esquecido: “Os batistas crêem na liberdade religiosa para si próprios. Mas eles crêem também na igualdade de todos os homens. Para eles, isso não é um direito; é uma paixão. Embora não tenhamos nenhuma simpatia pelo ateísmo, agnosticismo ou materialismo, nós defendemos a liberdade do ateu, do agnóstico e do materialista em suas convicções religiosas ou não-religiosas” (E. E. Mullins, citado por W. Shurden). Nossa posição está assentada na convicção de que o Evangelho, numa dada sociedade, não deve se garantir por meio das leis, mas por meio da influência da vida nova em Jesus Cristo. Não reza a maior parte das Histórias Eclesiásticas a convicção de que a derrota do Cristianismo consistiu justamente em seu irmanamento com o Império Romano? Impor a influência de nossa fé por meio das leis do estado não é afirmar a fraqueza e a insuficiência do Evangelho como “poder de Deus para a salvação de todo o que crê”? No mais, em regimes democráticos como o estado brasileiro, existem mecanismos de participação política e popular cuja finalidade é a construção de uma estrutura governamental cada vez mais participativa. Foi-se o tempo em que nossa participação política estava confinada à representatividade daqueles em quem votamos.
5. A Aliança de Batistas do Brasil se posiciona contra a demonização do PT, levando em consideração também que tal processo nega o legado histórico do Partido dos Trabalhadores na construção de um projeto político nascido nas bases populares e identificado com a inclusão e a justiça social. Os que afirmam o nascimento de um “império da iniquidade”, com uma possível vitória do PT nas atuais eleições, “esquecem” o fundamental papel deste partido em projetos que trouxeram mais justiça para a nação brasileira, como, por exemplo: na reorganização dos movimentos trabalhistas, ainda no período da ditadura militar, visando torná-los independentes da tutela do estado; na implantação e fortalecimento domovimento agrário-ecológico dos seringueiros do Acre pela instalação de reservas extrativistas na Amazônia, dirigido, na década de 1980, porChico Mendes; nas ações em favor da democracia, lutando contra a ditadura militar e utilizando, em sua própria organização, métodos democráticos, rompendo com o velho “peleguismo” e com a burocracia sindical dos tempos varguistas; nas propostas e lutas em favor da reforma agrária ao lado de movimentos de trabalhadores rurais, sobretudo o MST; no apoio às lutas pelos direitos das crianças, adolescentes, jovens, mulheres, homossexuais, negros e indígenas; e na elaboração de estratégias, posteriormente transformadas em programas, de combate à fome e à miséria. Atualmente, na reta final do governo de Luiz Inácio Lula da Silva, vemos que muita coisa desse projeto político nascido nas bases populares foi aplicado. O governo Lula caminha para seu encerramento apresentando um histórico de significativas mudanças no Brasil: diminuição do índice de desemprego, ampliação dos investimentos e oportunidades para a agricultura familiar, aumento do salário mínimo, liquidação das dívidas com o FMI, fim do ciclo de privatização de empresas estatais, redução da pobreza e miséria, melhor distribuição de renda, maior acesso à alimentação e à educação, diminuição do trabalho escravo, redução da taxa de desmatamento etc. É verdade que ainda há muito a se avançar em várias áreas vitais do Brasil, mas não há como negar que o atual governo do PT na Presidência da República tem favorecido a garantia dos direitos humanos da população brasileira, o que, com certeza, não aconteceria num “império de iniquidade”. Está ficando cada vez mais claro que os pregadores que anunciam dos seus púpitos o início de uma suposta amplitude do mal, numa continuidade do PT no Executivo Federal, são os que estão com saudade do Brasil ajoelhado diante do capital estrangeiro, produzindo e gerenciando miséria, matando trabalhadores rurais, favorecendo os latifundiários, tratando aposentados como vagabundos, humilhando os desempregados e propondo o fim da história.
Enfim, a Aliança de Batistas do Brasil vem a público levantar o seu protesto contra o processo apelatório e discriminador que nos últimos dias tem associado o Partido dos Trabalhadores às forças da iniquidade. Lamentamos, sobretudo, a participação de líderes e igrejas cristãs nesses discursos e atitudes, que lembram muito a preparação das fogueiras da inquisição.
Maceió, 10 de setembro de 2010.
Pastora Odja Barros Santos – Presidente
Pastores/as batistas membros da Aliança
Pr. Joel Zeferino _ Igreja Batista Nazaré – Salvador-BA
Pr. Wellington Santos – Igreja Batista do Pinheiro – Maceió-AL
Pr. Paulo César – Igreja Batista Bultrins – Olinda –PE
Pr. Paulo Nascimento – Igreja Batista da Forene – Maceió-AL
Pr. Reginaldo José da Silva – Igreja Batista da Cidade evangélica dos órfãos – Bonança-PE
Pr. Waldir Martins Barbosa – Ig. Batista Esperança
Pr. Silvan dos Santos – Igreja Batista Pinheiros – São Lourenço da Mata- PE
Pr. Marcos Monteiro – Comunidade de Jesus – Feira de Santana – BA
Pr. João Carlos Silva de Araujo - Primeira Igreja Batista do Recreio
Pra. Marinilza dos Santos - Igreja Batista Pinheiros – São Lourenço da Mata- PE
Pr. Adriano Trajano – Chã Preta – AL
Pr. Pedro Virgilio da Silva Filho - Serrinha BA
Pr. Gilmar de Araújo Duarte - PIB Brás de Pina – RJ
Pr. Alessandro Rodrigues Rocha - SIB Petrópolis, Petrópolis RJ
Pr. Nilo Tavares Silva - Igreja:Batista em Praça do Carmo, Rio de Janeiro RJ
Pr.Luis Nascimento - Princeton, NJ – USA
Pr.Raimundo Barreto – USA

5 comentários:

DANILO GOMES disse...

Concordo plenamente que é um absurdo demonizar o PT. Mas, igualmente absurdo é SACRALIZÁ-LO. Sabemos dos malefícios do governo FHC, e rechaçamos a política neoliberal praticada por ele e pelos partidos a ele coligados. Mas se formos honestos e deixarmos de lado os partidarismos e as ideologias, que quase sempre nos cegam, será que não houve nada de positivo naquela gestão? Assim também, reconhecemos os significativos avanços e benefícios do governo do Lula e do PT. Mas, francamente, será que nós, e a Aliança de Batistas do Brasil, devemos fazer vistas grossas ao mensalão, ao Zé Dirceu (que diga-se de passagem, faz parte da coordenação da campanha da candidata petista à Presidência), ao Palocci, ao Delúbio etc, etc, etc. E esqueceremos a omissão do Lula, que nunca sabia de nada, diante desses escândalos? E os exorbitantes lucros dos banqueiros e das empreiteiras, está valendo agora é? E as alianças com ACM, José Sarney e Collor, simplesmente fechamos os olhos? Só para lembrar, o candidato a vice-governador da Bahia pelo PT, Otto Alencar, historicamente sempre foi ligado ao carlismo; e agora? Acredito que ainda há muita gente boa dentro do PT, algumas delas dignas do meu voto nessas eleições, que ainda estão comprometidas com a ética e com as louváveis bandeiras históricas do partido! Mas acho sensato ouvirmos também as vozes de pessoas que sempre defenderam essas bandeiras e que se decepcionaram com os rumos do PT, tais como: Leonardo Boff, Heloísa Helena e Marina Silva, só para citar alguns. Se é para denunciar as mazelas políticas desse país, e a demonização generalizada do PT é uma delas, não se pode agir com partidarismo e deve-se buscar a todo custo a utópica imparcialidade. Afinal de contas a Aliança de Batistas do Brasil está se posicionando em nome de quem? Embora concorde com boa parte do que foi dito, em dado momento, achei que estava lendo um pronunciamento do Partido dos Trabalhadores, ou dos seus advogados de defesa. Quando estamos falando a partir do evangelho, não devemos nos posicionar ideológica e passionalmente por qualquer partido político. A nossa paixão e busca deve ser exclusivamente pelo Reino de Deus e sua justiça, procurando ser agentes desse Reino, sinalizando-o nesse mundo.

Paulo Nascimento disse...

Olá querido Danilo!

Primeiro, obrigado pelo comentário sensato e inteligente. Mas tal como você em relação ao "Pronunciamento" da Aliança, eu diria que concordo com você na maior parte de sua argumentação, porém discordo com alguns detalhes. (1) O objetivo do documento era somente tornar pública a diversidade de opiniões entre os batistas, para que a fala que originou toda essa discussão não ficasse para a sociedade brasileira como sendo "A posição dos batistas". (2) O documento não visa "sacralizar do PT". Existe uma diversidade enorme entre os membros da Aliança em relação a esse partido. Garanto a você que a maioria de seus membros tem uma postura extremamente crítica, semelhante à sua, em relação ao PT. Eu, por exemplo, por todas as razões que você enumerou, e ainda por outras, não votarei em Dilma!!! Essas questões não aparecem no documento por uma questão de foco e de propósito, que era relativizar a fala original da discussão. (3) O documento foi produzido tendo como pano-de-fundo uma leitura do Evangelho. Ela pode destoar de outras leituras, mas é uma entre as possíveis. A menção aos bons feitos do PT no passado foi usada como recurso argumentativo para relativizar sua suposta demonização. E acreditamos aqueles bons feitos são todos coerentes com aquilo que cremos serem valores do Evangelho.

Receba um grande abraço, e obrigado por acompanhar nosso blog!

Paulo Nascimento

DANILO GOMES disse...

Olá Pr. Paulo,

Obrigado pelos esclarecimentos. O diálogo sempre aguça a reflexão. Ao ler seu comentário e voltar a ler o pronunciamento, o vi com outros olhos. Conheci o trabalho da aliança o ano passado e tenho grande admiração por muitos dos seus associados. Por exemplo, achei espetacular a palavra da Odja na Consulta da FTL 2010, que infelizmente só vi por vídeo.

Grande abraço,

Dailo Gomes - Salvador/BA.

Kadija Teles disse...

Paaaulo, achei seu blog! Que legal! E o nome é bastante interessante!rsrs
Esse assunto deu o que falar, hein? Acabei de comentar no blog do Pr. Edvar que na minha opinião, quando o mundo acabar com esse negócio de lutar mais contra o diabo do que a favor de Deus, a coisa pode mudar...
É isso
Um grande abraço:
Kadija

Paulo Nascimento disse...

Querida Kadija!

Que bom revê-la, ainda que seja nesse ambiente insosso que é a virtualidade. Corroboro tuas palavras!

Receba um abração!

Paulo