Metafísica da vida cotidiana
(sobre a estética do insaciável)
(sobre a estética do insaciável)
Rodrigo de Barros
À força de almejar o Belo, Não encontrei senão torturas: Imagens retorcidas das angústias do mundo. Focos de incêndio criminoso nas fronteiras do amor. E uma sombra fugidia do inefável, Que é antes castigo do que bênção.
À força de almejar o Belo, Não encontrei senão tonturas. Dei passos de bêbado à beira d’um abismo Onde o inominável cantava como sereia, E com sua face de sátiro, Ria de minhas pretensões.
À força de buscar o Belo, Encontrei apenas o vazio dos anseios; Projetos caducos de uma perfeição longínqua; Miragens sedentas e impérios claudicantes.
À força de buscar o Belo, Lutei contra o monstro da descrença E contra o delírio da fé. Bradei na noite escura como quem descobrisse luz, Mas era tão somente minha esperança doentia Desenhando estrelas onde havia apenas breu e solidão. ... me vi monstruoso, e delirante.
Calei em alta voz o mais profundo silêncio. Nutri silêncio profundo em meio à multidão. Rasguei num único ímpeto as vestes rotas de Deus. Enamorei-me da loucura. Fiquei só.
Cheguei a descrer que a beleza existisse. Entreguei-me ao torpor dos ideais. Abracei vanguardas em nome da modernidade E mais tarde... me vi qual vitrine de antiquário: Exposto ao olhar ávido das novidades, Sedentas d’alguma ficção de origem.
À força de muito querer o Belo, Vi meus sonhos incharem qual fígado de alcoólatra. Vi meu corpo definhar, Anoréxico de mim mesmo, Viciado na linha do horizonte.
À força de querer o Belo Quase perdi a beleza da simplicidade: O aperto de mão dado com gosto; Um gesto de amparo sem pretensões; Um tropeço que se revela um encontro; Um descaminho que abre uma porta. (Ou mesmo a porta que se fecha na cara E a cara que ainda assim desafia a porta)
À força de almejar o Belo, Quase fui soterrado por técnicas e procedimentos; Quase afoguei em teorias. Quase morri para a beleza que escapa às fotografias, Que não pertence aos estetas ou moralistas, Mas se abre qual rosa impertinente n’um campo de urtigas, E provoca o abraço onde se esperava um murro.
Que espécie de insanidade nos fez crer Que a engenharia de um foguete Seria mais complexa do que um gesto de afeto? Ou que a origem do Universo seria algo mais esplêndido Do que a espontaneidade d’um sorriso de criança?
A Beleza é fugidia. Arredia. Rebelde. Não se entrega simplesmente a quem a busca, Embora possa ser colhida, Embora esteja ao alcance da mão.
Rodrigo de Barros é graduado e mestre em Psicologia, professor da Universidade Federal de Alagoas, e atualmente faz doutorado em Paris.
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