segunda-feira, 27 de julho de 2009

METAFÍSICA DA VIDA COTIDIANA


Metafísica da vida cotidiana
(sobre a estética do insaciável)

Rodrigo de Barros

À força de almejar o Belo,
Não encontrei senão torturas: Imagens retorcidas das angústias do mundo. Focos de incêndio criminoso nas fronteiras do amor. E uma sombra fugidia do inefável, Que é antes castigo do que bênção.

À força de almejar o Belo,
Não encontrei senão tonturas. Dei passos de bêbado à beira d’um abismo Onde o inominável cantava como sereia, E com sua face de sátiro, Ria de minhas pretensões.

À força de buscar o Belo,
Encontrei apenas o vazio dos anseios; Projetos caducos de uma perfeição longínqua; Miragens sedentas e impérios claudicantes.

À força de buscar o Belo,
Lutei contra o monstro da descrença E contra o delírio da fé. Bradei na noite escura como quem descobrisse luz, Mas era tão somente minha esperança doentia Desenhando estrelas onde havia apenas breu e solidão. ... me vi monstruoso, e delirante.

Calei em alta voz o mais profundo silêncio.
Nutri silêncio profundo em meio à multidão. Rasguei num único ímpeto as vestes rotas de Deus. Enamorei-me da loucura. Fiquei só.

Cheguei a descrer que a beleza existisse. Entreguei-me ao torpor dos ideais. Abracei vanguardas em nome da modernidade E mais tarde... me vi qual vitrine de antiquário: Exposto ao olhar ávido das novidades, Sedentas d’alguma ficção de origem.

À força de muito querer o Belo,
Vi meus sonhos incharem qual fígado de alcoólatra. Vi meu corpo definhar, Anoréxico de mim mesmo, Viciado na linha do horizonte.

À força de querer o Belo
Quase perdi a beleza da simplicidade: O aperto de mão dado com gosto; Um gesto de amparo sem pretensões; Um tropeço que se revela um encontro; Um descaminho que abre uma porta. (Ou mesmo a porta que se fecha na cara E a cara que ainda assim desafia a porta)

À força de almejar o Belo,
Quase fui soterrado por técnicas e procedimentos; Quase afoguei em teorias. Quase morri para a beleza que escapa às fotografias, Que não pertence aos estetas ou moralistas, Mas se abre qual rosa impertinente n’um campo de urtigas, E provoca o abraço onde se esperava um murro.

Que espécie de insanidade nos fez crer
Que a engenharia de um foguete Seria mais complexa do que um gesto de afeto? Ou que a origem do Universo seria algo mais esplêndido Do que a espontaneidade d’um sorriso de criança?

A Beleza é fugidia. Arredia. Rebelde.
Não se entrega simplesmente a quem a busca, Embora possa ser colhida, Embora esteja ao alcance da mão.

Rodrigo de Barros é graduado e mestre em Psicologia, professor da Universidade Federal de Alagoas, e atualmente faz doutorado em Paris.

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